Como a população se levanta depois de uma guerra (caos psíquico)
Por Mary Kirschbaum
Sim, é preciso se levantar.
Um país que se levanta da guerra, sob uma ótica psicanalítica, passa por um processo de cura coletiva do trauma, lidando com o luto, o estresse pós-traumático generalizado e a reconstrução de uma identidade nacional fraturada, onde o inconsciente coletivo é marcado pela violência, mas busca reparação através de narrativas de superação, memoriais e um novo pacto social, transformando o horror em força para o futuro, num complexo movimento de retorno do recalcado e criação de novos “tabus” e “totens”.
O TRAUMA COLETIVO
1) NEUROSE DE GUERRA: Freud já apontava as “neuroses de guerra”, onde o trauma desencadeia conflitos psíquicos profundos, manifestando-se em sintomas como ansiedade, pesadelos e flashbacks, mas em nível nacional, isto se traduz em histeria coletiva, culpa, raiva e dificuldade de processar a experiencia.
2) LUTO: A nação experimenta um luto massivo pela perda de vidas, infraestrutura e sua própria inocência, necessitando de um processo de elaboração do luto para não ficar paralisada.
A RECONSTRUÇÃO PSÍQUICA
1) MEMÓRIA E ESQUECIMENTO: O país precisa decidir o que lembrar e o que esquecer (recalcar) para seguir em frente, criando heróis, mártires e mitos que ajudem a unificar a narrativa pós-guerra, como os novos “totens” e “tabus”, mencionados por Freud em “Totem e Tabu”.
2) RUPTURA E CONTINUIDADE: há uma tensão entre romper com o passado destrutivo e manter elementos da cultura e identidade que sobreviveram, reconstruindo a “família” nacional.
SINAIS DE UM PAÍS EM RECONSTRUÇÃO:
1) SÍMBOLOS E RITUAIS: Construção de monumentos, museus da memória, cerimônias de comemoração, que funcionam como catarse coletiva e reafirmação da identidade.
2) CULTURA E ARTE: Surgimento de novas expressões artísticas (literatura, cinema, música) que narram a guerra e a esperança, expressando o trauma e a resiliência.
3) POLÍTICA E SOCIEDADE: Criação de novas leis, instituições e um novo “contrato social” que visa a paz e a justiça, muitas vezes com discursos nacionalistas ou de reconciliação.
4) ECONOMIA E TRABALHO: O “trabalho” de reconstrução física (emprego, infraestrutura) é também um trabalho psíquico, transformando a energia destrutiva em construtiva, uma forma de “sublimação” coletiva.
Em essência, o país em recuperação é como um indivíduo que passou por um trauma: ele carrega as cicatrizes, precisa de terapia (social e psicológica), de tempo para se curar e de um novo sentido para a sua existência, transformando o horror em um futuro possível.
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