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O bom filho

Por Nelson Menda

Depois de um longo e tenebroso inverno eis-me de volta à redação itinerante da Revista Bras.il. Por que itinerante? Porque, nesses últimos meses, não sosseguei o facho.

Saí às pressas de Miami, com o rabo entre as pernas, juntamente com o Noah, meu neto mais velho, em direção a um possível porto seguro na cidade de Portland, estado do Oregon. Do que fugíamos? De uma doença misteriosa que estava fazendo vítimas pelos quatro cantos do mundo. Não se sabia o que era, somente que estava matando pessoas de todas as faixas etárias, com uma predileção especial pelos mais idosos.

Depois de ter permanecido recluso dentro do meu próprio apartamento, em Miami Beach, por exatos 12 meses, de só entreabrir a porta para o entregador do supermercado, de utilizar luvas de borracha ao retirar as sacolas que ele havia deixado do lado de fora e aspergir álcool gel em todas as embalagens antes de abri-las. Naquela ocasião, minhas filhas sugeriram que eu e o Noah, meu neto mais velho, viajássemos para Portland, no Oregon, onde a caçula residia em uma ampla casa.

Além de máscara e luvas, a mais velha preparou uma espécie de elmo que funcionaria como uma segunda camada protetora contra um inimigo até então desconhecido e que utilizava as vias aéreas do organismo para se alojar, depois de promover grandes estragos, no organismo de suas vítimas.

No vôo entre Miami e Portland, com quase seis horas de duração e três fusos horários de diferença, as fileiras do avião foram ocupadas, por determinação da própria companhia aérea, de forma alternada, para evitar um possível contágio. Todavia, devo admitir algo que chamou minha atenção naquela viagem. Apesar das recomendações, um grupo de três pessoas, provavelmente da mesma família, não estava utilizando máscaras. Achei aquilo meio estranho, pois havia uma expressa recomendação da própria companhia aérea, para o uso daquele indispensável equipamento de proteção. Estava assistindo, sem me dar conta disso, o surgimento de uma nova categoria de seres humanos: os negacionistas.

Minha filha residia em uma ampla casa em Portland, onde havia, entre outros aposentos, um quarto isolado. Foi nele que me alojei, à espera de dias melhores. Consegui instalar e conectar meu laptop, o que me manteve ocupado e atualizado sobre o que estava ocorrendo no mundo exterior. A essas alturas, já se anunciava a produção de algumas vacinas, mas para recebê-las era preciso aguardar, pacientemente, que chegasse a nossa vez.

Quando, finalmente, esse dia chegou fui, de carro, para uma área pré-destinada no estacionamento do aeroporto de Portland e me surpreendi com a grande adesão de pessoas interessadas em ser imunizadas. Sinal de que, apesar da intensa boataria a respeito dos riscos de receber uma vacina nova e ainda não testada, o bom senso acabou prevalecendo. Sem precisar, sequer, desembarcar do carro, abri a janela do carona e recebi, no braço direito, a primeira de uma série de doses da Vacina da Pfizer. Desenvolvida, é preciso enfatizar, por um, como diria minha avó paterna, de los muestros.

Fui premiado, pois não tive reação alguma, a não ser uma leve sonolência. Depois dessa primeira, recebi uma segunda e uma terceira doses, além de um reforço denominado booster. Mesmo assim, não fiquei livre da Covid, pois algum tempo depois tive contato com um conhecido que também militava na ala dos negacionistas e, apesar de não apresentar nenhum sintoma e utilizar máscara o tempo todo, além de me contaminar acabei transmitindo a virose para uma das minhas filhas, meu genro e dois netos menores. Sobrevivemos todos, felizmente, mas perdi alguns queridos amigos nessa pandemia.

Mas nada como um dia depois do outro porque, por uma feliz coincidência, como em um passe de mágica, meu genro, engenheiro, foi selecionado para trabalhar em um projeto de conquista do espaço. Mais precisamente, do estabelecimento de uma base na Lua. O local escolhido para a construção, decolagem e retorno dos foguetes foi a região de Cabo Canaveral, na Flórida. Exatamente nas proximidades de onde me encontro no momento. Migramos todos, em diferentes levas, do Oregon à Miami e à chamada Space Coast dos Estados Unidos, de onde escrevo, após esse longo intervalo de tempo.

Da varanda do meu apartamento, que conta com uma deslumbrante vista do Atlântico, já tive oportunidade de assistir ao lançamento de um desses foguetes. Por sorte, em uma noite de céu claro e límpido, em que foi possível acompanhar, a olho nu, a trajetória da espaçonave que, depois de alçar vôo e de uma elegante meia volta em pleno ar, retornar, intacta, à plataforma de lançamento. Dessa vez, sem tripulantes em seu interior, mas já em preparação para futuros voos destinados a levar e trazer passageiros, de forma programada, entre nosso planeta e uma base habitada por terráqueos na lua. Qualquer semelhança com histórias e filmes de ficção científica, pelo jeito, não será mera coincidência, mas uma concreta realidade.

Foto: Wikimedia Commons

2 thoughts on “O bom filho

  • Susana Menda

    Boa historia , nao sabia que haviam feito tantos malabarismos com a Covid. Nos saimos todos os dias, como e de nosso habito, claro, mascaras e vacina , e ninguem da minha familia pegou Covid .
    Nunca lavei mercadoria vindo de super, nao tenho tempo para isso. O que fiz de diferente das outras pessoas? Ha mais de 3 anos tomando mel, limao, gengibre e alho.
    Sera que e isto que nos imunizou?

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  • Vani Medina

    Bem vindo a Flórida, caro amigo!
    São e salvo!
    Grande abraço…

    Resposta

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