Homenagem à família Bibas e nossa luta contra o obscurantismo
Por Adriane Kiperman. Psicóloga, diretora da + A Educação, presidente da Divisão Feminina do Keren Hayesod do Rio Grande do Sul
Estive em Israel recentemente, junto com um grupo de mulheres da comunidade judaica brasileira. Foi uma semana repleta de aprendizados e emoções, visitando e conhecendo as ações de Israel para recuperação da população e do país em meio à guerra. É preciso muita resiliência para superar os efeitos do tenebroso ataque terrorista do Hamas em 7/10/2023, que ainda mantém reféns em Gaza. Além do conflito em Gaza, as agressões vêm de todas as fronteiras do país, incluindo o Hezbollah, os Houthis, além do grande inimigo, que financia a todos: o Irã.
Dentre tantas experiências significativas, a que mais me tocou foi a visita ao Cemitério de Tzohar, onde prestamos homenagem à família Bibas, sepultada ali, junto a inúmeras outras vítimas do terrorismo. Três gerações de uma só família repousam juntas: Shri Silberman Bibas, de 32 anos, e seus dois filhos, Ariel, de 4 anos, e Kfir, de apenas 9 meses, além de seus pais, Yossi Silberman, de 67 anos, e Margit Silberman, de 63 anos.
Para nós, mulheres cujos antepassados sobreviveram ao Holocausto, é aterrador deparar-se novamente com tamanha brutalidade e ódio. A sensação é de fracasso: fracassamos como judeus, ao não antever o crescimento desenfreado do antissemitismo; fracassamos como israelenses, ao não conseguirmos proteger nossa população; e, acima de tudo, fracassamos como humanidade, por termos gerado seres capazes de tais atrocidades e outros muitos que os apoiam.
Como em pleno século XXI permitimos que essa monstruosidade aconteça? O que podemos dizer ao pai dessa família que recebeu os corpos de seus familiares em caixões trocados, após uma cerimônia festiva amplamente divulgada ao mundo? O que dizer aos nossos avós e pais, que sobreviveram ao nazismo e acreditaram que esse tipo de sofrimento pertencia ao passado? E aos nossos filhos, já nascidos sob a proteção do Estado de Israel, que pensavam que nunca mais haveria perseguições? O que dizer aos jovens protestantes pró-Hamas, aos políticos e aos intelectuais autodenominados progressistas, que ainda têm a audácia de acusar essas vítimas de “responsáveis” pela suposta “reação” ao sofrimento palestino? E, mais importante: o que dizer a nós mesmas, que educamos nossos filhos para serem boas pessoas, cidadãos respeitados nas comunidades onde vivemos, agora vendo-os ameaçados por agressões antissemitas?
Não é fácil, mas também não é novo. Como dizia nossa líder Golda Meir: “o pessimismo é um luxo a que os judeus não podem se permitir”. Precisamos reunir forças e nos inspirar na resiliência histórica do nosso povo para aprender com mais esta situação traumática e sairmos dessa luta contra o terrorismo e o antissemitismo ainda mais comprometidos com nossa cultura, identidade e valores.
Está claro que nunca os judeus da diáspora precisaram tanto de Israel, e Israel nunca precisou tanto da diáspora.
Devemos canalizar essa percepção de perigo e esse imenso senso de pertencimento, além de usar todo nosso conhecimento e capacidade para apoiar os israelenses, cujos filhos lutam por nós e pelos nossos.
Vamos promover a disseminação de informações que abram os olhos do mundo civilizado para o perigo do antissemitismo. Como se diz há séculos, “the jews are the canary in the coalmine”: uma metáfora que remete ao uso de canários em minas de carvão, que, pela sua sensibilidade aos gases tóxicos, paravam de cantar ou desmaiavam quando a qualidade do ar se deteriorava, servindo de alerta para os mineiros. Da mesma forma, o antissemitismo é um sinal precoce de que uma sociedade está doente, caminhando em direção ao autoritarismo ou fascismo.
Que a família Silberman-Bibas descanse em paz, mas nós não descansaremos até que tenhamos feito tudo o que está ao nosso alcance para que a barbárie não prevaleça. Precisamos fazer com que o mundo civilizado compreenda a urgência de lutar por uma cultura de coexistência, democracia e valorização da vida humana e do conhecimento. O obscurantismo sempre está à espreita, mas cada um de nós carrega a luz necessária para superá-lo.
Foto: Zachi Evenor (Wikimedia Commons). Memorial para a família Bibas, em Rishon LeZion, Israel
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