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À beira de um ataque de nervos, e uma luz no fim do túnel

Por Mary Kirschbaum

Lembro-me bem daquele dia.

Primeiro achei que era mesmo uma “gripezinha”, e que nada tiraria a gente do sério, que D’us era brasileiro, ou melhor… já que estou em Israel agora, penso talvez que somos o “povo escolhido”. E, portanto, seremos salvos. Amanhã acaba esta agonia.

Não acredito. Vamos entender melhor o que estes chineses fizeram mesmo…

Aí pirei!

Foi naquele dia. Meu marido comprou duas garrafas de vinho, já havia passado um mês mais ou menos, dos primeiros alertas, ou dois. Agora eu estava ligada na CNN 24 horas por dia, e só saia escondida da polícia para tomar a vitamina D.

Pirei…

Ele tocava e eu cantava, naquela noite, onde decidimos que íamos morrer. O vinho foi fazendo efeito, e aí eu cantarolava, de Roberto Carlos, Caetano Veloso a Raul Seixas. Como era mesmo aquela música? Ahh! O dia em que a terra parou… “essa noite, eu tive um sonho de sonhador, maluco que sou, eu sonhei… com o dia em que a terra parou”

Lockdown! “No dia em que todas as pessoas, do planeta inteiro, resolveram que ninguém ia sair de casa…

Aí foi, né gente… e ainda não saímos disto.

Só que não morremos, pelo menos aqueles que leem este texto.

Bem, desde o início até hoje, a pandemia da corona vírus completou dois anos de idade.

E quais os impactos para a nossa saúde mental?

Já passamos algumas fases e os vários sintomas e prejuízos psicológicos estão relacionados a elas.

A primeira fase foi caracterizada por uma aceitação de que existe algo, que está matando, e para se prevenir é necessária uma mudança radical de estilo de vida. A primeira reação foi a do medo de ser contaminado pelo vírus invisível que se aproximava. E aí as dificuldades começaram a surgir, com a necessidade da redução e distanciamento do contato físico. Precisávamos então nos policiar para evitar os abraços e beijinhos.

Ok, conseguimos nos segurar um pouco. Mas a medida que a pandemia avançou e permaneceu, foi gerando fortes fatores de estresse e causando desequilíbrios hormonais, muitas vezes desencadeando transtornos mentais mais graves, assim como ansiedades, depressões, síndromes do pânico e fobias mais sérias.

A segunda fase da epidemia foi relacionada ao confinamento; que exigiu uma forçada mudança de rotina. Nesta fase, surgiram as manifestações de desamparo, tédio e raiva pela perda da liberdade. Causando também ansiedade, além de irritabilidade e desconforto em relação a nova realidade.

E passaram muitas e muitas vezes a afetar a funcionalidade da vida do indivíduo.

A terceira fase se relacionou com as possíveis perdas econômicas e afetivas decorrentes da epidemia.

E as experiências traumáticas para aqueles que se contaminaram e adoeceram e foram internados, ou pior, aqueles que foram intubados ou necessitaram de tratamento intensivo. Estes, sim, de verdade, passaram concretamente por experiências próximas da morte, sendo as sequelas mais importantes, a depressão e risco de suicídio, e o desenvolvimento posterior do estresse pós-traumático.

E todos já tiveram notícias de perdas de amigos, familiares e conhecidos.

Pois é, vimos e vemos ainda um mundo virado de ponta cabeça.

Iniciamos o ano de 2022.

Nova variante detectada: Ômicron. Parece que já acostumamos a histerias e medos e inquietudes e questionamentos. Será que quem se vacinou não pega? O que fazer? O país vai fechar novamente?

Segundo o que estamos escutando ultimamente, notícias vindas do departamento de medicina da Universidade Hebraica de Jerusalém, “estaremos vivendo um estado pós-pandêmico, como vivemos com as várias variantes da gripe e outros vírus, e aí o fim da pandemia estaria próximo”!?

Sim! Uma variante mais contagiosa que a anterior, onde muitas pessoas serão, portanto, infectadas, mas terão coriza, talvez febre por alguns dias e continuarão com sua vida normal. E aí finalmente estaríamos desenvolvendo uma verdadeira imunidade de grupo! A famosa “imunidade de rebanho”.

Então, é possível que, de algum ponto de vista, a ômicron pode ser a “luz no fim do túnel”.

Bom, esperemos; porque ninguém aguenta mais falar de COVID.

Mas, de qualquer forma, já tivemos um verdadeiro desespero que culminou em verdadeiros aprendizados.

Sabemos agora identificar muito mais nossas emoções, que ficaram e ainda estão totalmente “à flor da pele”.

Identificando estas emoções, vamos desenvolvendo uma resiliência cada vez maior, que nos ajuda a recuperar mais rapidamente e reagir melhor a cenários adversos.

A enorme capacidade de adaptação das pessoas frente às mudanças, foi e está sendo outro aprendizado.

Aprendemos que podemos fazer mudanças drásticas na vida, e que há muitas formas diferentes e alternativas de se fazer as coisas.

E mudar pode ser muito bom.

Outra lição foi descobrir que temos verdadeiros potenciais como coragem para enfrentamento, capacidade de amar ao próximo e formas significativas de superar problemas difíceis do dia a dia.

Lançamos também um novo olhar às nossas relações como seres humanos, e identificamos o que realmente é importante nesta vida, visto que agora entendemos que um dia iremos partir.

Respeito, valorização e busca da essência. Este é o segredo.

E nunca, mas nunca mesmo, deixar de acreditar.

Fiquemos em paz.

Feliz 2022!

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