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O acordo marítimo entre Israel e Líbano – o que dizem seus defensores e oponentes?

Por Janine Ayala Melo

Israel e o Líbano chegaram a um acordo marítimo que irá influenciar suas economias e a relação entre os dois países. A grande maioria dos jornalistas na mídia internacional está apresentando uma imagem positiva deste acordo. Por outro lado, em Israel a situação é diferente. Eu acredito que muitas das análises feitas por israelenses que são a favor e contra o acordo marítimo se perdem no meio da avalanche de informação em inglês e português, que são majoritariamente a favor.

Por isso, eu apresento aqui um resumo dos pontos ditos pelos dois lados e espero que isso ajude a todos os brasileiros e brasileiras que querem se aprofundar no acordo e suas consequências a entender melhor a situação que Israel estará enfrentando daqui por diante.

O que os defensores do acordo dizem sobre ele?

Esta é a primeira vez desde o estabelecimento do Estado de Israel que o Líbano concorda em assinar um acordo implementado em uma estrutura internacional que liga o Líbano a Israel. Esta também é a primeira vez que há um acordo entre os dois países que visa pôr fim a um conflito político-econômico entre eles. Sim, houve acordos de segurança entre os dois países, mas estes se concentraram em cessar-fogo temporário e não em acabar um conflito entre os dois. Portanto, os apoiadores falam deste acordo como uma grande conquista política israelense.

Os apoiadores falam sobre o acordo como um documento que protege o requisito de segurança mais importante para Israel: a preservação da linha 1 (vejam o mapa, em vermelho), ou pelo menos seus primeiros 5 km. A preservação da linha 1 (chamada em hebraico de “kav hamatzofim”) é muito importante do ponto de vista da segurança israelense. Ele impede que os libaneses controlem a região norte de Israel e a ameacem. O acordo presente reconhece os 5 km da linha 1 como um “status quo”, ou seja, como uma linha que pode ser contestada caso comecem negociações entre Israel e Líbano sobre fronteira terrestre. Este é um ponto importante ao qual voltarei quando apresentar a posição dos adversários ao acordo marítimo.

O acordo também é econômico: segundo ele, Israel receberá pelo menos 17% do lucro total do reservatório de Tzidon-Kana. Os apoiadores afirmam que dos lucros esperados, que o Ministério da Energia de Israel estima em 3 bilhões de dólares, Israel receberá 500 milhões, valor considerado “dinheiro pequeno” para a economia israelense. Ou seja, segundo eles, Israel pode concordar com esse valor mesmo que seja “pouco dinheiro” porque para os libaneses o que eles receberão irá mudar o Líbano, e isso é bom para as relações entre os países e reduzirá a chance de um aumento da tensão na fronteira norte e a eclosão de uma guerra. Mesmo se Israel recebesse 40% dos lucros totais, um argumento que os opositores levantam, o valor que Israel receberia ainda seria um valor pequeno para a economia israelense e, portanto, pode-se argumentar, como os defensores do acordo fazem, que Israel se beneficiaria mais com tal acordo político do que se o tivesse renunciado e insistisse em receber mais porcentagens dos lucros do reservatório no centro da disputa.

No que diz respeito ao Hezbollah, os defensores do acordo afirmam que o chefe da organização terrorista, Nasrallah, não sai dele como um vencedor. Segundo eles, o Hezbollah se fortalece com o conflito em curso com Israel e, como o acordo enfraquece o conflito, este também enfraquece o poder do Hezbollah.

O que dizem os oponentes?

Enquanto os defensores destacam o acordo como uma conquista política na qual será estabelecida pela primeira vez uma linha de fronteira marítima entre os dois países, os opositores do acordo destacam os aspectos negativos do estabelecimento desta nova fronteira marítima. Veja no mapa: a linha 1 é o “kav hamatzofim”. Esta é uma linha de defesa que Israel estabeleceu unilateralmente depois que se retirou do Líbano em 2000. A demanda israelense era receber o reconhecimento do Líbano para os primeiros cinco quilômetros da linha, segundo os quais são de extrema importância para a segurança de Israel na fronteira norte. Mas há dois problemas com isso, de acordo com os oponentes.

Em primeiro lugar, o acordo não reconhece oficialmente o início da linha 1 como fronteira entre os países. Esta fronteira recebeu o status de “status quo”, ou seja, não há compromisso futuro com ela e esta pode mudar se Israel e Líbano iniciarem negociações na fronteira terrestre, que nunca foi acordada entre as partes até o momento.

Segundo, apenas os primeiros cinco quilômetros estão incluídos no acordo. Depois disso, a fronteira rompe para o sul e continua na linha 23. Isto significa que Israel está realmente cedendo uma área de águas econômicas que era sua até então.

Além disso, o Líbano receberá parte das águas territoriais de Israel. Aqui o debate é tempestuoso e tem muitas interpretações porque essas águas territoriais são reconhecidas apenas por Israel, porque este foi quem as determinou unilateralmente após a retirada do Líbano. Por isso, alguns acreditam que se está é uma retirada de águas territoriais, o acordo deve ser aprovado na Knesset e receber uma maioria de 80 deputados como exige a “Lei Básica: O Referendo” (Mishal HaAm). Do outro lado, há quem argumente que como esta é uma linha sobre a qual não há acordo internacional, a aprovação de 80 membros da Knesset não é obrigatória neste caso.

No final, a Assessora Jurídico do Governo decidiu a situação. Ela afirmou que o acordo não tem de ser apoiado por pelo menos 80 parlamentares. No entanto, ela determinou que o acordo precisa ser votado na Knesset, o que atualmente não parece que irá acontecer.

Do ponto de vista econômico, os opositores do acordo não consideram que abrir mão de parte da receita da represa de Tzidon-Kana seja uma conquista política. Primeiro porque eles não veem isso como uma conquista política, como detalhei anteriormente, e segundo porque eles não falam sobre os lucros como “dinheiro pequeno”. Além de tudo isso, eles apontam que Israel está iniciando a reabilitação econômica de um estado inimigo, sem garantias políticas de sua parte.

No que diz respeito ao Hezbollah, os opositores do acordo apontam que as ameaças do Hezbollah foram um catalisador para a assinatura do acordo, que se eles não tivessem ameaçado Israel, este não teria sido pressionado e assinado. Há também opositores que veem o Líbano como um estado do Hezbollah, ou seja, um estado que é completamente controlado pela organização e, portanto, se o acordo serve ao Líbano, na verdade serve aos terroristas que o controlam.

Este é um resumo dos argumentos ditos aqui em Israel. Mais importante do que basear sua opinião sobre o assunto a partir do partido que você apoia, é importante que você leia todos os argumentos ditos, acompanhe jornais e baseie sua opinião a partir do que você (e não o político que você segue nas redes sociais) acredita ser melhor para o país.

Foto: Energean Power FPSO

One thought on “O acordo marítimo entre Israel e Líbano – o que dizem seus defensores e oponentes?

  • Salus Finkelstein

    Muito bom resumo sobre acordo,

    Resposta

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